Em resposta ao comment do Alex…

May 11, 2009 § 5 Comments

Ou talvez falar que seja em resposta seja um erro: ele não fez nenhuma pergunta, não expôs nenhuma opinião da qual eu discorde e nem me contradisse.

Talvez o correto fosse comentar o comentário, mas já que eu sou o dono do blog, e que eu tenho liberdade pra transformar meus comments em posts, resolvi falar um pouco sobre o que ele falou.

Primeiramente, eu gostaria de explicar porque o post se chamou “Projeto Insanidade”, e porque é um post tão relevante que mereceu a criação de uma categoria só pra ele.

Assisti no final de semana que passou “Conduta de Risco” (cujo nome em inglês era “Michael Clayton” – por deus, como eu odeio os tradutores de nomes de filme).

O filme fala sobre um Advogado (Michael Clayton) em uma crise pessoal e que, de repente, se vê o brigado a lidar com a crise pessoal de outra pessoa: o bambambam do processo civil nos EUA que está tomando conta do caso de uma Monsanto da vida. Esse advogado tem um freakout no meio de um caso e o melhor amigo dele é o Michael Clayton.

Eu vou evitar falar muito sobre o filme pra não estragar a surpresa, mas recomendo forte que todos assistam.

Pra mim, o ponto alto do filme é o que motivou o freakout do advogado fodão (não, não vou fazer spoilers). Foi algo tecnicamente bobo, mas que simplesmente deixou ele insano. Ou, pra tentar ser justo, o jogou em uma espiral ascendente de insanidade gloriosa.

E eu me sinto definitivamente em uma espiral ascendente de insanidade gloriosa. Estou ficando paranóico. Mas paranóico SÉRIO. Não estou falando que “eles” querem me pegar, ou que o flúor na água é um veneno de longa duração pra controlar nossos cérebros.

Não, pior.

Eu tenho a nítida impressão de vez em quando de que tudo (TUDO) é parte de um grande plano divino e que a gente não percebe, mas as pequenas coisas que acontecem possuem uma razão de ser maior do que nós pensamos.

E eu fico tentando descobrir o que, por que e pra quê. E é assustador porque as coisas se encaixam de uma forma perfeita, como um relógio suíço. E quando você tem um glimpse das engrenagens se movimentando de forma tão perfeita, você não consegue fazer mais nada a não ser virar e perguntar: Quem é o relojoeiro? O que ele QUER? Por que as engrenagens se movem nesse sentido?

E é frustrante, porque você não encontra o relojoeiro, aí por um instante você desiste e racionaliza como se fosse meramente uma coincidência… mas depois acontece OUTRA coincidência, e mais outra e outra, e outra… e quando você menos espera, você está lavando louça, conversando com alguém sobre seu professor de hapkido, e você deixa cair um copo que se quebra e você percebe: “Cara, eu tenho que sair do hapkido.” Porque aquilo é um sinal, e você sabe que aquilo faz sentido: Vou sair do hapkido porque um copo quebrou, ORAS!

Ou então quando você acabou de sair do cinema onde você estava com uma menina, e pensando menina na qual você deu um cano pra sair com essa, sendo que você acha as duas legais sairia com qualquer uma, mas se você pode sair com as duas, por que escolher uma só?

Só que você começa a ficar meio incomodado com dar um perdido na outra, e não queria aquilo. E você chega em casa e começa a conversar com seu amigo que está lá, e ele está ouvindo a rádio cultura, ou alguma outra, num programa de Jazz, e você pergunta pra ele o que ele acha.

Ele responde de forma sensata e racional: “Nunca coloque todos os seus investimentos em um lugar só: os americanos falam: não coloque todos os ovos numa cesta só.”

E você não se sente bem com essa resposta, ela não te satisfaz, e, de repente, começa a tocar Ella Fitzgerald, um blues que fala com todas as letras no último verso: “I’m betting everything I got on you.”

Nome da música? I’m putting all my eggs in one basket.

Aí eu resolvi namorar uma delas e fomos felizes para sempre.

Oh, não, errei a história. A gente começou a namorar e eu tive uma treta homérica com ela em cerca de um mês, que me machucou pra caralho, machucou ela pra caralho, mas, no final, acho que serviu para que ambos crescêssemos.

E hoje ela é uma das quatro mulheres mais relevantes da minha vida.

Teve também o dia em que um rio transbordou por tempo o suficiente para que eu ficasse ilhado e tivesse uma conversa importante, ou o dia em que eu encontrei a chave que abria um portão só depois de terminar uma outra conversa importante, ou o fato de que o meu pai morreu no dia em que eu nasci, ou um monte de outras coisinhas que eu me lembro e que fazem sentido, mas são grandes demais.

E assustam. Assustam porque às vezes você pensa que Deus matou alguém pra que você saísse da sua zona de conforto, mas isso é um absurdo… é… loucura.

E o Projeto Insanidade é sobre isso. Sobre a gloriosa insanidade que nos faz olhar pra um copo quebrado e decidir sair do Hapkido. Sobre um atendente do Mcdonalds que se lembra de você. Sobre chaveiros gigantescos e frases infelizes. Sobre moedas de dez centavos numa quadra de futebol de areia. E sobre como tudo isso faz sentido, mesmo que um sentido insano: que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que eu não a saiba. E que ninguém a tente complicar, porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.

Dizem que a desordem é uma ordem que não nos convém. Sendo assim, a Loucura é uma razão que não nos convence.

Isso era a primeira parte (que não tem nada a ver com o comment do Alex e que mostra que esse post vai ficar GRANDE).

Agora, Alex, você me diz que a sua amiga anda pela rua sem olhar para o rosto das pessoas, e que ela se orgulha disso.

Sabe, eu entendo ela. Faz todo o sentido do mundo. Eu arriscaria dizer que ela é gata e prepotente. É um chute e eu odeio fazer esses chutes porque dali a pouco você fala “é nada, ela é baranga” e eu fico com cara de otário (mais).

Mas tem duas coisas a respeito disso:

Pra mim, andar sem olhar para os outros é simplesmente ignorar inúmeros sinais que o mundo te dá. As pessoas olham pra você e reagem. E as reações são uma coisa quase sempre hard-coded no seu cérebro: a espontaneidade raramente é controlada.

Temos que aprender a ler o mundo. Olhar pro céu e saber se vai chover. Olhar pra uma menina e saber se ela está interessada por você. Ver o que o seu chefe quer, se o seu cachorro está doente, se a sua namorada está na TPM, se o bebê está com cólica, etc.

O mundo GRITA pra você, mas muitas vezes você está meramente cantando alto demais pra ouvir.

Quando teve o tsunami na indonésia uma menina se safou porque viu animais indo pra cima de um morro. Ela levou a família e sobreviveu lá, junto com cabras e vacas. Ou sobreviveu pra morrer de alguma doença que deu depois. Whatever.

Todo mundo podia ter visto aquilo, mas só ela entendeu.

O que as pessoas que olham pra você vêem? Você consegue saber? A imagem que elas enxergam é a que você passa e a que você quer passar?

Seus amigos te conhecem, fato… mas os estranhos? O que eles falam a seu respeito quando calam?

A sua amiga está simplesmente ignorando o que todas as pessoas que andam pela rua estão falando pra ela. Ela simplesmente se nega a ouvir as vozes. E eu quero MUITO ouvir essas vozes.

Entende agora como as coisas são insanas? Eu quero “ouvir as vozes”.

Hoje de manhã um gari me deu bom dia. Por quê? Tem uma formiga andando na minha mesa há horas. De onde ela veio? Tenho quase certeza que ela chegou comigo. Por quê?

Sua amiga evita ao máximo ouvir o que o mundo fala. Por quê? Será que ela tem medo do que as vozes falam? Por quê? Será que ela se basta? Duvido. Eu diria mais, diria que ela é insegura e que tem medo de dar o primeiro passo em direção a uma conexão com alguém e esse primeiro passo ser um passo em falso. Ela veio ao mundo pra ser objeto de conexão, não conectora.

E agora, permitam-me um momento Juremeiro, isso é muito comum com mulheres. E é até explicável: elas são o pólo passivo da sedução. Trabalho de sedução para mulheres normalmente se resume a “seja gostosa e leve cerveja”. A gostosinha tem que ficar lá, na torre de marfim, e esperar algum cavaleiro em armadura brilhante aparecer, superar todos os desafios que ELA deixou lá, e eles viverão felizes para sempre.

Claro, existem os pontos fora da curva, mas, via de regra, o trabalho da mulher para escolher um parceiro é basicamente o trabalho de excluir aqueles que não interessam pra ela. Quer seja “sendo difícil”, quer seja “não olhando pros olhos das pessoas na rua”.

Porém, Alex, as pessoas não se bastam sozinhas. Ela podem até tentar, mas não conseguem. Porque essas mesmas pessoas que se isolam do mundo são as pessoas que vão numa micareta beijar 27 pessoas em quatro horas. São as mesmas pessoas que querem catar aleatórios e aleatórias na balada. Ou então que colocam uma grana em drogas, putas, carros, roupas, qualquer coisa que as façam se sentir mais amadas e queridas. Como dito logo no começo de “Crash”: “Sabe… o problema é a pele: Nós não tocamos mais nas pessoas.”

Tentamos criar substitutos para a Oxitocina, mas não adianta: “Você nunca vai se sentir satisfeito com uma coisa que você não quer!”

A gente tenta viver como animais, nascendo, crescendo, se reproduzindo e morrendo. Pensando na próxima trepada, na próxima cerveja, no próximo salário, na próxima carreira, na próxima briga, no próximo livro, no próximo carro, na próxima viagem… e a gente não entende porque está SEMPRE infeliz! Alternando momentos de euforia com tristeza, talvez, mas alegria de verdade, felicidade de verdade, a gente não tem.

E não tem porque felicidade DE VERDADE é amor incondicional. É olhar pra um mendigo na rua e identificar nele um ser humano. E respeitar. É olhar pra um pombo sem dedos na Praça da Sé (e o que mais tem é pombo sem dedos em São Paulo) e ver que ele é um ser vivo. Olhar pro atendente do Mcdonalds com os mesmos olhos que você olha pra sua namorada.

E no fim, isso é loucura! Porque deixar com que seus pensamentos e sentimentos não sejam influenciados pelo que acontece ao seu redor é meramente mandar à merda a lei da causalidade.

Ou seja: a amiga do Alex que foge do mundo está certa, porque ela não quer ter conexões com as pessoas porque sabe que aquilo vai gerar nela reações. Eu sou insano porque quero ter conexões, mas quero que as minhas reações não obedeçam à causalidade.

Eu quero agradecer a um cara que me deu porrada na rua.

Felicidade não vem dos outros pra você. Os outros podem te dar muita coisa: dinheiro, hallellujahs, orgasmos, carinho, reconhecimento, atenção, conversa e mais um monte de coisas que são boas sim, são gostosas sim e agradam sim e que eu quero sim!

Mas não causam felicidade.

Ninguém pode te dar felicidade. Porque felicidade brota de você. Porque felicidade, alegria de verdade, realização completa, é casar livre-arbítrio com destino. E pra fazer isso você tem que SABER qual o seu destino. Como fazer isso? Bom, eu tento ler os sinais.

§ 5 Responses to Em resposta ao comment do Alex…

  • alexthomaz says:

    – A felicidade brota de você.
    – Tudo se resume a livre-arbítrio e destino.
    – Ver o próximo como um semelhante.

    Sabe o que isso me lembra? (Agora é aquela hora que eu me reparto e começo a bater em mim mesmo pela citação horrível que vou fazer. Ok, ok, Alex… já lembrei de outra citação, não vou falar do Alquimista de Paulo Coelho – AI!) Me lembra um filme chamado “o último samurai”, em que um inimigo, ao invés de ser morto, é praticamente adotado por uma família, aprende seus hábitos, treina e luta ao lado de seu inimigo, sendo vencido e morto, ao final, por seus próprios compatriotas.
    Existem um milhão de mensagens nesse filme (e uma delas é que seu inimigo é inimigo por mera força das circunstâncias), mas uma frase que sempre me marcou é aquela que diz que “o guerreiro precisa procurar longe aquilo que está escondido dentro dele”.
    Todas essas “mensagens” e “conclusões” que você (e eu também) chegou (chegamos) na verdade, são mantras repetidos a nós desde que somos crianças. Mas sim, eu precisei flertar com todos os tipos de descrenças e e você com você sabe muito bem o que, para entendermos aquilo que já sabíamos. Que o outro é um semelhante, é um “irmão” (ao menos no sentido da humanidade que compartilhamos).
    Sobre a minha amiga… Ela não é baranga, mas também não é gata. Ela é uma pessoa que eu definiria como alguém que gosta de fazer as coisas do seu jeito. Sabe o anti-herói? é ela. Se perguntasse a ela por que ela não olha para as pessoas, uma resposta seria “Ah, eu não olho porque as pessoas sorriem pra mim, e eu odeio ficar sorrindo pra quem eu não conheço!” (e daria risada do próprio escárnio que faz dos “sinais que o mundo lhe dá”). Mas sabe de uma coisa? Eu posso dizer que eu acho que ela é infeliz. E sabe por que? Porque ela não se permite. Ela não permite que as ondas cheguem em sua praia, e prefere ser um planeta estéril.
    Porque sexo ela tem quando quer.
    Porque amor, ela tem quando quer, porque ela é uma princesa em uma torre de marfim, onde mesmo vencidos todos os obstáculos, ela te deixa pra fora de uma última porta trancada, que é seu coração (não o seu, o dela).
    Porque dinheiro, ela tem quando quer. Pedindo para os pais ou trabalhando com mais afinco quando precisa.
    Mas mesmo assim… ela prefere chorar sozinha do que sorrir para o mundo e receber um sorriso de volta.
    Ainda assim eu não a culpo. Eu sei muito bem como é se sentir uma engrenagem que simplesmente não encaixa em nenhum lugar desse grande relógio.

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  • Rebs says:

    Yeah we need conections man! E o mundo tá tão doido que eu preciso de um cachorro pra conversar com meus parentes…

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  • Juremeiro Preto says:

    É por isso que eu vou pro Acre.

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  • Gabarra says:

    Tá meio dificil de ler no escritório então não tem muita relação com o escrito (ou talvez tenha, mas não é intencional). Achei o dropkick fazendo esse cover de thin lizzy, ouso dizer que ficou mais maneiro que a original:

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  • Gabarra says:

    Numa história semelhante, fui identificado pelo dono de um buteco em campinas. “Você fazia judo na Joaquim Antunes, em São Paulo “. Não era judo, mas passei por 10 anos na frente do bar que ele trabalhava. Nunca se quer entrei lá, mas ele me viu crescendo… E agora, pelo menos 5 anos depois, servindo skol numa madrugada fria, ele lembrou de mim.

    É estranho sim. A gente se retrai no nossa bolha, passa pelo mundo sem percebê-lo, torcendo pra não ser percebido de volta. Possivelmente isso é um resquício de tempos mais bárbaros, quando se tinha certeza que quem vinha de longe não vinha por bem. Parece estranho manter esse hábito, ainda que inconscientemente, numa sociedade pretensamente civilizada. É certo que existem pessoas mal intencionadas, mas estão longe de ser maioria.

    E é triste porque temos essa coisa que insistimos em chamar de vazio emocional (é mais um vazio holístico, por mais bizarro que isso soe). E como o Tarso já colocou, orgasmos, pilhas de dinheiro, fama, relaciomentos saudáveis não podem preencher isso. Nada que vem de fora pode. No máximo aliviar os sintomas momentâneamente. Sendo um nada que contem tudo, esse vazio só pode ser diminuído pelo nosso crescimento.

    Por ser uma jornada essencialmente pessoal, e pela natureza transitória dos relacionamentos humanos, podemos ter a impressão de que estar sozinho é uma condição insuperável. Mas é nossa escolha compartilhar os passos já dados, e aproveitar aqueles que nos são oferecidos. Caminhar lado a lado com aqueles que estão na mesma direção que nós. Ou não.

    Mas crescer é muito mais difícil sozinho.

    Uma frase que considero interessante, e que complementa a escolhida pelo Alex, foi atribuída a Confúcio: “A iluminação não está no Tao, mas em todos os lugares”.

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